terça-feira, 29 de outubro de 2013

TRÊS ONTOLOGIAS CLÁSSICAS E A WEB SEMÂNTICA-Marcos Luiz Mucheroni, Daniel C. de Paiva e Marcio Lobo Netto

Resumo
O conceito de ontologias se desenvolveu historicamente acompanhando as diversas áreas do saber, as quais se organizaram em determinadas épocas do pensamento humano. Assim, fazer uma análise pormenorizada das ontologias de cada época e relacioná-las ao pensamento é fundamental para o entendimento da dinâmica do próprio conhecimento. Além disto, este estudo visa auxiliar na elaboração das ontologias atuais a partir das relações existentes em determinadas áreas de domínio, sendo possível a ampliação até a análise de áreas temáticas para a web semântica. O objetivo deste trabalho é conceituar três grandes sistemas de ontologias (Aristóteles, Jacob Lorhard e Leibniz- Wolff) e estabelecer a relação destes com a evolução das ontologias e os conceitos da Web semântica atuais.

Palavras-chave: Ontologias clássicas. Web semântica. Ontologias atuais. PontodeAcesso, Salvador, v. 3, n. 2, p. 281-298, dez. 2009.

1 INTRODUÇÃO
Na filosofia clássica o termo ontologia foi empregado como referente ao conhecer o
que era o ser, mas o ser em geral, tanto a sua razão como o seu logos e assim estreitamente
relacionado à lógica, enquanto o sentido ôntico ligado ao ente deve ser pensado como o ser
de fato e, portanto, não necessariamente ligado ao logos.
É necessária esta compreensão porque evita a confusão entre realidade ontológica e
realidade ôntica. Embora inseparáveis na ordem do ser, são distintas na determinação
filosóficas e esclarecedoras nas ontologias atuais.
É importante ainda saber que aceitar esta terminologia não implica a aceitação do
pensamento kantiano, que afirma que o sujeito pode conhecer a priori unicamente os
fenômenos, “como aparecem”, mas não as coisas em si, ou seja, em linguagem kantiana, os
noumenos. A partir disto, neste trabalho busca-se auxiliar estudos que procuram visualizar e
compreender teoricamente as modernas ontologias.
Curiosamente é tanto moderna quanto escolástica, pois também para ela havia tal
distinção, e as com sideravam como: ôntico significa o ente ainda não está descoberto pelo
espírito como intelligibile in potentia, ou seja, que será conhecido de alguma forma,
enquanto o ontológico, por sua vez refere-se aos entes já esclarecidos, descobertos e
organizados, ou seja, o intellectum in actu, ou seja, o que é já lógico, e pode ser explicitado
como tal.
Na atualidade, os estudos que procuram desenvolver relações conceituais de diversas
naturezas e temas, mas que ainda não são claras deveriam ser ônticas e não ontológicas,
enquanto aquelas que já possuem algum consenso dentro de determinado domínio, podem
ser colocadas em determinada ontologia e por isto formal.
A compreensão de domínio é, pois importante, porque pode estender o campo de
análise do estritamente conceitual para o social. Conforme definição (HJØRLAND, 2004, p.
4): “[…] pode ser uma disciplina, um campo escolar. Pode ser ainda uma comunidade
discursiva conectada a um partido político, à religião, ao comércio, ou a um lazer”, ou seja,
uma comunidade discursiva pode ser uma rede social.
Esta abordagem, de acordo com Hjørland (2002), enfatiza uma relação entre a Web
semântica e as comunidades discursivas com objetivo de tratar recursos informacionais
como sendo identificados, descritos, organizados e disseminados para servirem a um
objetivo específico, sendo compatível com a Web em ambiente social. Este trabalho tem
como objetivo explorar características desse universo, desenvolvendo ontologias históricas,
e a partir de análise de sua importância, indicar que tipos de ontologias podem se estruturar
a partir da Web atual.
Para o desenvolvimento das ontologias que serão apresentadas neste artigo foi
escolhido o ambiente Protégé (2009), pois este possui código aberto, é multiplataforma,
oferece interface gráfica e uma arquitetura para a criação de ferramentas baseadas em
conhecimento. Sua arquitetura é modular e permite a inserção de novos recursos (plugins).
Além disto, possui alguns exemplos que podem ser consultados pelo usuário, permite a
geração de saídas gráficas diversas (diagramas de vários tipos) e está em constante
desenvolvimento como pode ser verificado no site da ferramenta.
[...]

Figura 1 – A ontologia aristotélica usando a ferramenta Protégé-Fonte: ARISTÓTELES, 1978.

Figura 2 – A ontologia de Jacob Lorhard (1606) construída no ambiente Protégé-Fonte: LORHARD, 1606.


Figura 3 - O modelo “conceitual” de Leibniz-Wolff no ambiente Protégé-Fonte: WOLFF, 1729.


Figura 4 - O modelo “epistêmico” de Leibniz-Wolff no ambiente Protégé-Fonte: WOLFF, 1729.

5 OS MODELOS ATUAIS E A WEB SEMÂNTICA
Os modelos elaborados na computação, com os quais se pode perfeitamente ser
traçado um paralelo com a ontologia clássica de Aristóteles/Platão, em Ciência da
Computação, usando método dedutivo, são denominados top-down, ou usando o método
indutivo, bottom-up.
O método indutivo possibilita a elaboração de modelos, partindo, da representação
de elementos e/ou objetos e suas relações dentro de um contexto, ou seja, um
conhecimento estabelecido. Já o método dedutivo propõe que se pense primeiramente no
domínio ou contexto, independentemente de pensar os elementos e suas relações, o que
então é feito numa etapa seguinte.
Será exatamente o método da teoria da classificação (RANGANATHAN, 1967)
denominado faceta, que usa o método dedutivo para classificar o conhecimento dentro de
um domínio, que permitirá compreender a relação com a Web semântica, pois trabalham
metaníveis conceituais, categorias e não apenas abstrações. Como ontologias
computacionais partem de classes de conceitos pode-se elaborar um domínio no modelo
chamado top-down?
O modelo de Ranganathan é importante porque supera a tradicional dicotomia, cuja
ilustração mais tradicional é a “árvore de Porfírio”, porém Ranganathan apoiou-se na
“árvore baniana” cujo modelo ficou conhecido como policotômico.
Toda análise inicial filosófica serve aqui apenas para compreender que o modelo que
se fundamenta exclusivamente na abstração tem como raiz as ontologias.
Por outro lado é apenas uma forma de abstracionismo fruto da própria dualidade
sujeito/objeto, da qual têm origem tantas outras formas dicotômicas na construção de
modelos conceituais.
É o caso da orientação a objetos em Ciência da Computação, que usa atributos e
classes. As classes aqui usam os métodos indutivos, que podem criar abstrações úteis para
um determinado modelo, mas será apenas, a partir da dedução, possível compreender e
estruturar unidades de conhecimentos, e não da indução a partir de unidades de dados.
Assim os métodos não podem ser pensados de forma separada, embora possam ser
pensados de forma sistêmica, a partir do processo indutivo, seguido do dedutivo, no qual se
estrutura a análise e a síntese, mas devem ser pensados como processo conjunto, no qual a
indução parte da análise de domínio e a dedução são propiciadas pela facilidade que inclui o
uso de recursos e processos computacionais.
No desenvolvimento de agentes e processos de inteligência artificial, na construção
de ontologia formal, alguns autores tais como Guarino (1998) criam objetos ou particulares,
que podem ser classificados como concretos e abstratos.
A ontologia formal não possui uma classificação específica para o relacionamento
entre categorias, por isso é possível criar relações muitas vezes não ontológicas “clássicas”
porém formais e claramente dedutíveis e passíveis de sínteses.
O ponto essencial para permitir a formalização em ontologias é compreender um
objeto ocorrente, conforme o chamam diversas teorias (DAHLBERG, 1978; WUESTER, 1981)
e outras. Para isto pode-se utilizar o conceito de Sowa (2000) que chama este objeto de
processo, o que torna explícito que se trata de uma “ação” sobre objetos existentes e
formais. Porém isto não significa ignorar a construção ontológica de cada objeto.
A relação entre estes objetos ainda está ainda em pleno desenvolvimento através de
linguagens de ontologias (Ontologies Web Language - OWL) e o incipiente processo na
criação de agentes inteligentes (BERNERS-LEE; HENDLER, LASSILA, 2001).
A interoperabilidade semântica, também conceituada como interoperabilidade de
metadados, desenvolve a descrição dos recursos de informação para facilitar o intercâmbio
e a recuperação da informação por parte do usuário. Nesse processo faz-se uso de um
conjunto de ferramentas para a representação da informação contida nos recursos,
incluindo ambientes de construção de ontologias e metalinguagens.
A ontologia, inserida nessa tipologia de interoperabilidade, define os termos e suas
relações em domínios, usando regras de combinação desses termos e relações.

6 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Ainda que o termo ontologia tenha se referido a conceitos e processos diferenciados
ao longo da história do pensamento humano, três conclusões são possíveis sobre a sua
essencialidade: as relações entre conceitos gerais e particulares, o auxílio às formulações
sobre o que são as coisas em-si, sejam elas: seres, substâncias ou simplesmente conceitos, e,
sua relação com a organização e o desenvolvimento do conhecimento em geral, em especial
na contemporaneidade, onde os grandes sistemas parecem não ter mais a consistência e a
complexidade dos sistemas que aumentam constantemente.
Tanto as ontologias clássicas como as formais decorrentes do uso da lógica e de que
forma os sistemas computacionais podem cooperar neste processo.
PontodeAcesso, Salvador, v. 3, n. 2, p. 281-298, dez. 2009.

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