Hora de despedir-me:
Srs Gens Div Minicelli, José Carlos, Oliveira e Jaldemar, companheiros, meus familiares, senhoras e senhores.
Estou muito feliz com a presença de todos. Sinceramente...
Os renascentistas faziam belas esculturas em mármore, porém os jovens artesãos que não podiam frequentar as escolas juntavam cera ao pó de mármore para esconder as imperfeições de suas peças, que derreteriam no próximo verão. Daí os verdadeiros mestres colocarem placas indicativas “sine cera” em suas obras primas.
Sinceridade, portanto, vem do latim e indica transparência, sem máscara.
Sr Gen Minicelli, obrigado pela sinceridade dessa homenagem e pelas palavras bondosas do Sr Chefe do DCT!
Em 1924 a Coluna Prestes arrastou meu avô: Vitório Callai, à luta armada em busca de ideais de justiça e igualdade no movimento denominado “tenentismo”, no qual meu avô obteve a graduação de cabo batedor, agraciado pelo então Capitão Oswaldo Cordeiro de Farias, mais tarde, interventor do Rio Grande, e heroico comandante da Artilharia Divisionária da FEB na Itália. Eu imagino que ambos devam ter desenvolvido uma relação de confiança e amizade na dureza daquela marcha, uma vez que se tornaram compadres e o tio Oswaldo, filho caçula do vô Vitório, acabou recebendo o nome de seu padrinho.
Quis o destino,[ ] a mão de Deus, que 40 anos mais tarde o sargento Oswaldo fosse condenado e recolhido à Ilha da Cobras, por ser declarado comunista pela Revolução Redentora de 64. Mesmo sendo peixe de um general ex-combatente ele pagou com a carreira sua desatenção ao responder um IPM. Enquanto isso, o sargento Callai, meu pai, estabelecido em Três Corações, destacava-se como militar de escol e foi encarregado pelo Tenente Alcedir Pereira Lopes de recolher o comandante da EsSA preso a Juiz de Fora, por desconsiderar radiograma recebido e ter deixado passar a tropa de Pouso Alegre pela Fernão Dias (motivado por sua postura “em cima do muro”).
Quarenta anos depois, em 2004, o tio Oswaldo havia sido reabilitado, passando a capitão da reserva e anistiado político, e o Gen Alcedir, infelizmente, falecera, não sem antes contar a história da EsSA um monte de vezes, ensinando-nos princípios de lealdade e o papel valoroso do sargento na Força Terrestre.
Eu exercia, na época, o comando do Batalhão Escola de Comunicações, o Barão de Capanema, e tinha certeza que outra revolução seria desencadeada a qualquer momento (24, 64, 2004) e eu seria chamado a protagonizar atos heroicos, como os de meu pai e meu avô, ou seria escorraçado do comando pelos associados da APEB, alguns companheiros que o BEsCom acolhera, movimentados que foram do Recife e, dois deles, do 5º CTA.
Essa numerologia dos 40 anos manteve-me em alerta todo o período e não perdia de vista o realismo dos fatos e a honradez do cumprimento do dever, máximas inegociáveis, sobre as quais vinha pautando meu comportamento na caserna. Informação para bem cumprir a missão!
Ali no Rio de Janeiro passamos, eu e meus subordinados, incólumes por algumas operações reais e de lambuja, pude chefiar o 5º CTA, na terra abençoada do Recife, sem comprometer o nome da família. Ser filho de sargento me ajudou muito em ambas missões. [ ]
Obrigado senhores generais Enzo e Albuquerque por me nomearem para exercer a chefia e o comando, para os quais fui preparado.[ ] Perdoem-me, meus subordinados, pelas vezes que não fui exemplo de retidão e isenção para vocês. Quando fui discricionário e, amparando-me apenas no bom senso e na aparência, decidi por um lado, em detrimento de outro. Falo isso sem arrependimento, na certeza de que não faria tudo de novo, caso as oportunidades se repetissem, porque agora, acumulo mais experiência.
Há uma espiral da aprendizagem que vai-se alternando entre conhecimento tácito, quando a gente medita e contempla, e o explícito, quando trocamos ideias e interagimos com superiores, subordinados, familiares, amigos e, principalmente, mentores. Daí sermos melhores a cada dia.
Meu pai foi meu único mentor até os 10 anos de idade, ensinando-me a pescar, atirar, escalar, pedalar, montar e a obedecer. A reserva de material do subtenente da Bia Art da EsSA foi a extensão do meu lar. Já interno no CMBH o tio Mauro Almeida, homem bom e paciente, dividiu com o meu pai a mentoria e me acolheu no seio de sua querida família onde passava os fins de semana. Meu avô Hermínio tutoriou o desenvolvimento no ensino médio, na Preparatória e o tio Toninho Almeida me orientou na AMAN, onde era instrutor de geografia, na época, e cuja disposição em ajudar nas tarefas do lar, tornou-se referência de pai e marido dedicados.
O judô, a ginástica artística e o voleibol ensinaram-me a respeitar regras e a perseverar, com entusiasmo até o último minuto do combate. No esporte pude ser experimentado no limite das capacidades física e mental e ainda, aprendi a relevar os erros próprios e a perdoar o erro dos outros, para buscar novos resultados. Fui, orgulhosamente, o capitão da equipe bi-campeã de volei da NAVAMAER.
Aos mentores Sargento José Inácio do Nascimento, professor Fernando Brochado e Cel Lúcio Alfredo do Monte Gomes, um sincero HIP-HURRA! Os senhores contribuíram para minha formação moral, ensinando-me a não desprezar os vencidos, além de reforçarem a máxima de que só a repetição pode trazer a perfeição.
A palavra entusiasmo vem do grego e significa "ter um deus dentro de si". Segundo eles, só as pessoas entusiasmadas eram capazes de vencer os desafios do cotidiano, criar uma realidade ou modificá-la. Eu creio que há um Espírito Santo dentro de nós. Por isso, as pessoas entusiasmadas acreditam em si, agem com serenidade, alegria e firmeza. E acreditam igualmente nos outros. Não é o sucesso que traz o entusiasmo, é o entusiasmo que traz o sucesso, dizia o Sr Gen Salvador no CMNE.
O meu plano de vida, agora, está na fase de deixar o serviço ativo para dedicar-me aos estudos: da bíblia, dos problemas brasileiros, dos eventos desportivos e, certamente, daqui a duas semanas estarei escrevendo alguma coisa para os amigos. Obrigado aos que recebem meus e-mail e não reclamam. Obrigado, também, por estarem aqui, prestando atenção na concordância verbal do discurso, para depois fazerem chacota comigo, numa perversa retaliação [ ] porque me amam, mesmo eu sendo tão crítico e provocador. Perdão por isso! Vocês sabem o quanto aprecio nosso convívio amistoso e espontâneo. Sou devedor a cada um de vocês pela atenção que têm comigo e com a Ana.
Ainda com relação aos mentores, agradeço ao Cel Lisboa, meu primeiro comandante no 4º BCom, por ter forçado seis aspirantes a comprarem um terreno em Pernambuco para terem aonde ser enterrados (sic). Ao Cel Ruy pela amizade sincera e Cel Cramer pelo incentivo ao crescimento. Agradeço ao Cel Corrêa (Humberto Corrêa de Oliveira) por insistir comigo que criasse o hábito de escrever memórias. Foram quatro trabalhos julgados aproveitáveis pelo EME e há outro em processamento.
Ao Cel Castilho por nosso convívio no CIGE e no EME, que contribuíram para meu amadurecimento profissional. Aos generais José Carlos e Carvalho pela paciência que tiveram com minha pessoa e pelo exemplo que são de determinação em consertar o mundo. Ao Cel Félix por me colocar dentro da ECEME e pela amizade positiva, empurrando-me sempre para cima e para o alto. Ao Gen Jaldemar pela clarividência de posicionar o C2 Cmb no mesmo nível dos sistemas de C2 da MB e da FAé em reunião do GT SICECOS ali no MD. Ao Gen Oliveira pelas inúmeras vezes que me socorreu com recursos, com movimentações e com sábios conselhos, meu sincero brado de RONDON!
Ao Gen Emílio, meu chefe imediato no passado recente, exemplo de profissionalismo e seriedade na gestão dos recursos financeiros. Aos senhores generais Heleno, Maier, Minicelli e Valdetaro, apesar do curto espaço de tempo e de convívio, agradeço a orientação firme que me permitiu priorizar as demandas do GC2 para buscar o atingimento dos objetivos visualizados. Aos amigos generais Marconi, Amir e Bráulio minhas desculpas por atravessar a linha da intimidade e, por vezes, ter sido folgado com os senhores, mesmo motivado pelo realismo dos fatos e na busca do cumprimento da missão, segundo disse, eu deveria poupá-los tendo mais sensibilidade e tato.
Deus há de recompensá-los todos.
Quanto ao Exército sinto-me empatado. Não devo e nem fui logrado. Foi uma troca justa. Uma verdadeira escola de vida.
Por fim, minha esposa e sogra, meus filhos e nora, meu irmão e irmãs, meus pais, nosso querido pastor...a luta continua!...estes aí vão-se ver livres de mim, mas vocês, não! He, he, he.
Presto minha homenagem a todos pais aqui presentes.
A educação vem do berço. A capacidade que descobri em mim de fazer coisas, principalmente quando coagido, tornaram-me uma pessoa do bem. A ameça de tomar uma “camaçada de pau” fez-me levantar da cama, lavar banheiro e entrar no ônibus para voltar do licenciamento escolar, muitas vezes. Assim como os mentores, o papel dos pais é fundamental para mudarmos nossa cabeça, nosso exército e nosso país.
Felizmente, o sangue aguerrido dos italianos Callai foi pacificado pelo sangue de trabalhador dos portugueses Ferreira de Almeida. O avô materno Hermínio foi taxista por mais de 50 anos e do suor de seu rosto muito bem educou cinco filhos. Entre suas peripécias há uma viagem em que transportou um determinado fazendeiro paulista para aquele Estado e se viu escondido numa trincheira da revolução de 1932, tendo seu automóvel arranhado por estilhaços de granadas arremessadas pela aviação da Força Pública de São Paulo. Mas essa eu conto em outra oportunidade.
Porém os senhores, façam comigo a conta...de 1932 para 72, ano em que toda família Callai saiu de Três Corações, são 40 e somando mais 40 dá exatamente o ano vindouro, 2012.
Estarei pronto para ser mobilizado, na reserva ativa! Rsrs.
Desejo, sinceramente, que Deus os mantenha entusiasmados por suas carreiras e que Ele os abençoe a todos. Ao SiTIEx, à Arma de Com e ao EB...HIP-HURRA!
Obrigado SENHOR!
ASSINO EM: Brasília, 30 de setembro de 2011.
Nenhum comentário:
Postar um comentário